o acto de expor perante o outro a cerimónia de me despir para mim, permite-me valorizar o palco criado para sentir na pele a importância da vulnerabilidade, e a pertinência de ter de um espelho-eco que posso revisitar.
acredito que as nossas paixões vão de mãos dadas com as nossas questões mais profundas - com os chamados dragões que vimos aprender a domar, os maiores medos ou fragilidades. já escrevi imenso sobre desnudar-me, já perdi ou desfiz-me de muitos dos textos, e encontro sempre no corpo o fio de toda a minha história - do que necessito recordar e do que já foi tempo para esquecer.
desta sessão recordo especialmente as imensas lágrimas que encontraram momento para me inundar, expressando uma tristeza magnética que tardou a abandonar-me. a minha vulnerabilidade espantou-o, fazendo-o questionar a sua própria tristeza e como a cultura americana (de onde ele nasce) condiciona a sua expressão.
se me sentia um trapo de que me adiantava fingir que me sentia radiosa - por mais que ele me convidasse a sorrir, a brilhar, a camuflar? chorei. e não quero pause nenhum. podes fotografar assim mesmo: inchada de chorar. não gosto de me ver assim, mas é parte de quem sou e parte de por onde tenho que passar...
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pouco depois eram gargalhadas soltas que partilhávamos no espanto e prazer de poder conduzir o meu corpo a posturas inusitadas, empinadas, viradas do avesso.
das sessões pelas quais passei enquanto modelo, guardo um mesmo sentir de empoderamento, de liberdade, de pacificação com a minha matéria. e sorrio cúmplice ao recordar semelhanças nos feedbacks de quem tenho tido o previlégio de fotografar.
já que tudo é passageiro, já que ora nos sentimos belos ora monstros, multiplicarmos as oportunidades de recordar que somos perfeitos parece-me sábio. sobretudo assim, no que nos faculta a senti-lo desde dentro.
recordando, recordando, até que não nos esqueçamos. até que as nossas células o cantem em uníssono.
tenho orgulho na minha história e, se este é o corpo que a conta, é com a amor que o acolho. que o habito, que o desfruto, e que aprendo a orgulhar-me dele também. recordando. recordando.
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